04 de Abril de 2018
Após mais de 40 anos de contrato com a Radial Transportes sem licitação, a Prefeitura de Ferraz de Vasconcelos começou os trâmites para abrir uma concorrência pública e contratar uma empresa para gerir esse serviço. Em 2017, a Câmara de Vereadores autorizou a abertura da licitação.
Agora, a administração municipal afirma que a próxima etapa é a realização de audiências públicas, que vão servir de base para o contrato.
A previsão inicial era que duas audiências fossem realizadas até março, porém, de acordo com a Prefeitura, nenhuma ainda foi marcada.
Segundo a Procuradoria do Município, a Radial opera o transporte na cidade desde 1976 sem nunca ter sido feita uma licitação para a exploração do serviço, ao contrário do que determina a Constituição Federal de 1988 para o setor público.
Atualmente, de acordo com a Radial Transportes, a cidade conta com 16 linhas, transportando uma média de 15 mil passageiros por dia. O valor da tarifa no município é de R$ 4,10.
Ações
O Ministério Público entrou com uma Ação Civil Pública em 2016 questionando a prorrogação do contrato. No processo, constam como investigados Jorge Abissamra e José Izidro Neto, ambos ex-prefeitos; além da empresa Radial e seus sócios, Edison Fujiura e Roberto Umada.
Em 2017, a Procuradoria do Município, que já investigava o caso em uma sindicância na Prefeitura, propôs um aditamento para a inclusão do atual prefeito, José Carlos Fernandes Chacon (PRB). No entanto, a Radial e Chacon recorreram e os dois agravos de instrumento estão sendo analisados pela 2ª Câmara de Direito Público, no Tribunal de Justiça de São Paulo.
A Radial diz que este processo que envolve a empresa e seus dirigentes está suspenso. A empresa afirma que “continuará operando normalmente dentro da regularidade e da legalidade e que trabalha em restrito cumprimento as leis, normas, regras e contrato”. Ainda segundo a Radial, os sócios não irão se manifestar sobre o caso.
De acordo com o Ministério Público, há ainda um processo movido pela Procuradoria do Município que tem como investigado apenas o atual prefeito José Carlos Fernandes Chacon.
Esta ação é por causa da demora para a licitação e para a conclusão da sindicância aberta para apurar o caso.
Segundo Tribunal de Justiça, este segundo processo está em fase inicial de apresentação de defesa.
De acordo com a Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura, o prefeito José Carlos Fernandes Chacon não é investigado na ação, pois foi pedida apenas sua inclusão no processo, trâmite que ainda não foi deferido. Ainda de acordo com a nota enviada, assim que assumiu a gestão da cidade em 2017, o prefeito enviou para a Câmara Municipal o pedido para licitar a concessão do transporte público.
Sindicância
Além das ações, há uma sindicância na Prefeitura, conduzida pelos procuradores do município, para apurar por que os últimos três prefeitos não abriram a licitação, mesmo após orientação da Procuradoria.
Para os procuradores ficaram evidentes as irregularidades e algumas recomendações foram feitas, como a realização de uma licitação e também o pagamento de multa pelos envolvidos. Ainda segundo a Procuradoria, o documento, não foi analisado por nenhum dos prefeitos.
De acordo com o ex-prefeito José Izidro Neto, a sindicância foi aberta na época do seu mandato, porém, por conta de um recurso apresentado pela Radial, as investigações ficaram paradas na Secretaria de Assuntos Jurídicos.
A defesa do ex-prefeito Jorge Abissamra diz que a prorrogação do contrato aconteceu por “se mostrar benéfica ao Município, assim como em consonância com a legislação municipal, Lei Complementar nº 067/1996, que prevê a possibilidade de sucessivas prorrogações de concessões, ainda que já tenham sido prorrogadas anteriormente ao início da vigência da referida lei.”
Ainda segundo a advogada de Abissamra, não há nenhum questionamento quanto à constitucionalidade da lei municipal e afirma que “a Lei Federal que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços público não estabelece prazo para início da realização de licitação para concessões já outorgadas antes do início de sua vigência, o que também respalda a conduta do ex-Prefeito de prorrogar o contrato então em curso.”
Histórico de Contratos
De acordo com a ação movida pelo MP, o primeiro contrato foi firmado em 1976 e tinha duração de dez anos. Ou seja, até 1986, dois anos antes da promulgação da Constituição Federal.
Segundo o Ministério Público, no fim do contrato, foi feito um Termo de Prorrogação de Contrato de Concessão de Serviço Público por mais dez anos (que duraria até 1996).
Mesmo após a Constituição ter sido promulgada, uma nova prorrogação do contrato foi feita com validade por mais dez anos – até 2006.
O MP diz que “dando continuidade à desobediência das previsões constitucionais e infracionais” foi feito um “aditivo contratual” por mais 14 anos, permitindo que a empresa continuasse operando o transporte na cidade a partir de 2006 até 2020.
A ação civil protocolada pelo Ministério Público em 2016 explica que as prorrogações no contrato são consideradas nulas, uma vez que a Constituição Federal exige a licitação. “Ainda que contratada a concessão e prorrogada pela primeira vez antes da promulgação da 8.987/1995 [lei que dispõe sobre licitações], o contrato esteve mantido até 25/07/1996, em obediência ao prazo nele fixado. A partir de então, para que fosse concedido o serviço público de transporte municipal, seria necessário prévio procedimento licitatório para a escolha da empresa que adentrasse às premissas fixadas. (…) tal prorrogação se deu em afronta à ordem jurídica, razão pela qual é nula de pleno direito.”
O documento ainda questiona uma Lei Complementar Municipal de Ferraz que diz que “todas as concessões vigentes poderão ser prorrogadas, mesmo que já tenham sido objeto de prorrogação anterior.” Segundo o MP, a previsão é considerada ilegal, pois vai contra ao que está previsto na Constituição Federal.
O Ministério Público afirma que a relação entre a Prefeitura e a Radial Transportes “é despida de validade”, o que “implicaria em vantagem excessiva à Empresa Radial quando comparada com demais contratantes.”
A ação civil diz ainda que “na medida em que não se contrata determinada empresa sem a observância de um procedimento licitatório, privilegia-se sobremaneira determinada pessoa em relação às demais que possuiriam, em tese, igual, possibilidade de contratação.”
O Ministério Público diz que os sócios da empresa, Edison Fujiura e Roberto Umada, devem responder por quebra dos princípios da legalidade, moralidade, igualdade e imparcialidade. À Radial Transportes, o MP diz que devem ser aplicadas, além das sanções decorrentes dos atos de improbidade administrativa, punições que também estão previstas na Lei Anticorrupção.
O MP avalia que, para evitar a perpetuação de um contrato nulo, é necessária a suspensão do vínculo contratual entre a Prefeitura e a Radial.
Fonte: G1