Por: André Antunes Soares de Camargo
Temos presenciado, nos últimos meses, uma grande discussão acerca de um tema que pode ou não vir a se tornar muito importante no cenário jurídico-político do nosso país, qual seja a instituição das denominadas “parcerias público-privadas” (PPPs), as quais foram criadas e implementadas com sucesso em diversos países, mormente na Inglaterra, e que agora são objeto de um projeto de lei federal em discussão no Congresso Nacional, podendo ser convertido em lei em um futuro bem próximo.
Em primeiro lugar, a idéia das PPPs alinha-se à tendência mundial de flexibilização na contratação de bens e serviços por parte da administração pública, após o esgotamento de praticamente todos os demais modelos tradicionais (privatização, licitação, concessão etc.), possibilitando, desta forma, criar oportunidades de negócios também para a iniciativa privada, tão castigada pela alta e desproporcional carga tributária existente e que tem levado a um índice recorde de informalidade no Brasil. Atividades originalmente exploradas pelo Estado passam a ter seus frutos igualmente desfrutados pelos particulares, os quais se valerão de sua eficiência e experiência no ramo escolhido para objeto da PPP.
Outrossim, as PPPs constituem um passo fundamental para a atração de investimentos de longo prazo para projetos de infra-estrutura, saúde, segurança pública e educação para os quais o Estado, com suas próprias forças e orçamento, não pode implementar com a devida eficiência, abrangência e qualidade. Tal avanço reside no fato de que há uma partilha de risco entre os setores público e privado, arcando o primeiro somente com a remuneração sobre a efetiva disponibilidade da obra ou serviço realizado pelo particular e dentro de parâmetros de qualidade e eficiência pré-determinados, dispensando, assim, desembolso, de pronto, de qualquer montante por parte do Estado. Há, portanto, uma partilha de riscos mais equilibrada, diferentemente do que ocorre nas tradicionais formas de contratação, tais como nas concessões.
Em contrapartida, o Estado precisa demonstrar sua credibilidade como sócio dessa modalidade de empreendimento em conjunto, daí porquê existem muitos investidores céticos com relação ao sucesso das PPPs, até porque sem investimento da iniciativa privada, nenhum projeto de PPP poderá ser sequer contemplado. A tradicional suspeição que o Estado brasileiro carrega em matéria jurídico-política pode vir a pesar em desfavor das PPPs, mormente quando se pergunta, por exemplo: a) Quem regulará e fiscalizará os contratos de PPPs? b) Qual o regime tributário aplicável, já que o próprio Estado é um dos parceiros do empreendimento? E existe algum incentivo fiscal nas PPPs? c) Como será selecionado o parceiro privado? Teremos garantias de imparcialidade nessa escolha? d) E como minimizar os riscos existentes, sejam eles de crédito por parte da administração, político, do próprio contrato, de desapropriação, da morosidade judicial para solução de conflitos, da variação cambial nos casos de investimentos estrangeiros, da ilegalidade do próprio contrato firmado entre as partes em relação às demais leis em vigor no país?
Há uma partilha de riscos mais equilibrada, diferente do que ocorre nas tradicionais formas de contratação
Como o raciocínio de qualquer investidor está baseado na equação “quanto maior o risco, maior deve ser o retorno”, o Estado deverá impulsionar a tramitação do projeto de lei federal que institui a PPP tendo em vista que as garantias a serem oferecidas aos particulares deverão ser claras, sólidas e proporcionais ao montante a ser por eles aportado, até porque tal desembolso será de imediato e a remuneração por parte do Estado virá tão-somente no momento da efetiva disponibilização da obra ou serviço à população.
Portanto, o sucesso e viabilidade prática dessa iniciativa requer uma atenção especial ao investidor convidado a participar de uma nova forma de parceria com o Estado brasileiro. De nossa parte, na qualidade de advogados, estamos acompanhando a tramitação do aludido projeto de lei, identificando os prós e contras do mesmo, bem como nos preparando para que, na nossa atividade diária de aconselhar juridicamente os clientes, elaborar contratos com a administração pública contendo cláusulas sólidas e executáveis com base nesse novo instituto que se apresenta.
Como São Paulo e Minas Gerais já possuem leis próprias instituindo as PPPs em âmbito estadual, elas são uma realidade mais próxima do que imaginamos. Só haverá sucesso nas PPPs se Estado e iniciativa privada puderem ter segurança e expectativas de que a tradicional cultura do “curto prazo” reinante no país possa ser desta vez deixada em segundo plano e que, em prol de uma oportunidade de negócio ímpar que pode lograr frutos para os dois parceiros concomitantemente, as parcerias público-privadas sejam viáveis e não apenas conjecturas.
André Antunes Soares de Camargo é advogado, com LLM em Direito Societário e Contratual – Universidade da Califórnia, Davis e Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie. É coordenador adjunto do IbmecLAW (Centro de Estudos em Direito do Ibmec São Paulo).