RHS Licitações

Pregão (2º artigo)

 

Por: Simone Zanotello
 

Dando continuidade à nossa análise com relação ao pregão, temos que essa modalidade, assim como qualquer outra, deverá ser precedida de uma fase interna, na qual o órgão requisitante, por meio de uma autoridade competente, definirá o bem ou serviço comum a ser adquirido, seu quantitativo, justificando sua necessidade e verificando sua disponibilidade no mercado, (inclusive com a realização de um prévio orçamento), além de estipular as exigências de habilitação, o critério de aceitação das propostas, as sanções para os casos de inadimplemento, os prazos para fornecimento e as cláusulas do contrato. O administrador também poderá dispor padrões mínimos de desempenho para a manutenção da qualidade desse bem ou serviço.

De posse desses dados, o administrador poderá elaborar o edital que deverá conter, além dos elementos dispostos no art. 40 da Lei n°. 8.666/93, todo o procedimento de realização do pregão.

É oportuno salientar a importância da fase interna, não só do pregão, como de qualquer outra modalidade de licitação, pois se essa etapa da licitação for efetivada da maneira correta, em atendimento às exigências legais, certamente a Administração terá êxito na contratação.

Já a fase externa do pregão tem início com a divulgação desse edital, que deverá ficar disponível por, no mínimo, oito dias úteis, sendo que, de acordo com o art. 4o., inc. I da Lei n°. 10.520/02, “a convocação dos interessados será efetuada por meio de publicação de aviso em diário oficial do respectivo ente federado ou, não existindo, em jornal de grande circulação local, e facultativamente, por meio eletrônicos e conforme o vulto da licitação, em jornal de grande circulação, nos termos do regulamento de que trata o art. 2o.”

Esse dispositivo relativo à publicidade, por ser muito abrangente, deverá ser regulamentado pelo órgão que implantar o pregão, definindo os meios de divulgação de seus editais, em conformidade com sua realidade, dentro dos limites ditados pela lei. O Governo Federal estipulou seus procedimentos de divulgação, por meio de decreto, levando-se em conta os valores das contratações, sendo que quanto maior for o valor, maior será a divulgação dentro dos órgãos de imprensa. Além disso, ainda se tem a divulgação do edital por meio da Internet.

Os trabalhos do pregão deverão ser comandados por uma figura denominada pregoeiro, com capacitação obrigatória para o exercício de suas funções e que deverá ser escolhido dentre os servidores do órgão ou entidade promotora da licitação. Ele será responsável, por força do disposto no art. 3o., inc. IV da Lei n°. 10.520/02, pelo recebimento das propostas e lances, pela análise da aceitabilidade das propostas e dos preços, pela negociação dos valores (se for o caso), e pela habilitação e adjudicação do objeto do certame à licitante vencedora caso não haja recursos, além de outras atividades. Portanto, é muito importante que o órgão licitante verifique a personalidade e as habilidades dos pregoeiros, pois esses deverão ser pessoas ativas, motivadas, conhecedoras da legislação das licitações e do objeto a ser licitado, além de contar com capacidade para tomar decisões rápidas e, principalmente, para realizar negociações.

O pregoeiro deverá contar com a ajuda de uma equipe de apoio, composta, em sua maioria, por servidores ocupantes de cargo efetivo ou emprego da administração, preferencialmente pertencentes ao quadro permanente do órgão ou entidade que promover a licitação. Com isso, entende-se que essa equipe deverá ser composta por técnicos, que poderão auxiliar os trabalhos do pregoeiro nas mais diversas áreas (jurídica, econômica, fiscal, técnica, etc.).

É importante salientar que essa equipe de apoio não tem a mesma função da tradicional “comissão de licitações”, pois, ao passo que esta última se constitui num órgão colegiado, cuja decisão, embora individual, dispõe uma característica de coletividade, com responsabilidade solidária de todos os integrantes, a equipe de apoio tem como função apenas auxiliar os trabalhos do pregoeiro, que age isoladamente no processo. Embora com essa conceituação, tem-se claramente que as equipes de apoio, apesar de apenas auxiliarem as ações do pregoeiro, possuem sim responsabilidade acerca de seus atos, como servidores públicos que são. Diante disso, presume-se que o pregoeiro terá mais segurança para poder exercer suas atividades com tranqüilidade e tomar suas decisões.

Uma outra modificação que o pregão trouxe no processamento das licitações, e talvez a mais importante, em virtude da agilidade que ela proporciona ao procedimento, é a inversão das fases de habilitação e de análise das propostas. Ao passo que numa licitação tradicional primeiramente se analisa a documentação de todos os participantes, para se verificar qual será habilitado e terá sua proposta apreciada, no pregão essas ações se invertem e, inicialmente, serão analisadas as propostas dos participantes, verificando-se somente os documentos de habilitação daquela licitante que ofertou a melhor proposta. É realmente uma racionalização nos procedimentos, tornando-os mais ágeis. Nesse contexto, é importante frisar que, em virtude da análise dos documentos de habilitação ocorrer apenas em uma segunda fase, antes do início dos trabalhos de abertura de uma licitação na modalidade de pregão, as licitantes, ao apresentarem seus envelopes (proposta e documentos), deverão exibir também uma declaração de ciência e cumprimento das exigências contidas no edital, sob pena de serem aplicadas as sanções previstas em lei ou na própria licitação, caso isso não se concretizar. É uma maneira de tornar o procedimento mais formal, e fazer com que as licitantes tenham responsabilidade no momento de apresentação de suas propostas.

Entende-se oportuno frisar que a fase de análise das propostas do pregão será composta por dois momentos distintos. O primeiro deles se refere à análise das propostas escritas, que passam por um critério inicial de aceitabilidade, com a verificação de sua conformidade com as exigências do edital. O segundo momento se refere à etapa de lances verbais e sucessivos, a ser realizada com o autor da proposta de menor preço, juntamente com aqueles que apresentarem propostas com valores até 10% acima desse menor preço, esclarecendo-se que caso não haja pelo menos três propostas nessas condições, estarão aptos a participarem da sessão de lances os autores das três melhores propostas.

Essa etapa de lances é muito importante e representa a adoção parcial do princípio da oralidade. Ela necessitará da ação direta do pregoeiro, que deverá incentivar a redução dos preços durante um certo tempo. Mas com isso vem a questão: qual é esse tempo? É missão de o pregoeiro determinar esse tempo, de acordo com a competitividade do processo, a participação das licitantes e em virtude do preço de referência que a Administração possui.

Além disso, é salutar que o edital estabeleça um percentual mínimo de redução entre os lances, a fim que não sejam dados preços com diferenças irrisórias entre si, tornando o procedimento demorado e desmotivador para os participantes.

Findada a sessão de lances, o pregoeiro deverá efetuar uma nova aná
lise da proposta, em especial comparando-a com o valor de referência obtido na fase interna da licitação, podendo, inclusive, negociar diretamente com a licitante classificada em primeiro lugar, e declarar a aceitação da proposta, salientando que no pregão o critério de julgamento deverá ser sempre o de menor preço. Só então é que se passará para a análise das condições de habilitação dessa licitante.

As exigências habilitatórias do pregão, embora mais simples, guardam muita similitude com o contido na Lei n°. 8.666/93, visto que de acordo com o art. 4o., inc. XIII da Lei n°. 10.520/02, “a habilitação far-se-á com a verificação de que o licitante está em situação regular perante a Fazenda Nacional, a Seguridade Social e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, e as Fazendas Estaduais e Municipais, quando for o caso, com a comprovação de que atende às exigências do edital quanto à habilitação jurídica e qualificações técnica e econômico-financeira.” E, além disso, os documentos de habilitação também podem ser dispensados na hipótese do licitante já possuir cadastro no órgão ou entidade promotora da licitação, o que deve contar com previsão no edital.

Se a licitante cumprir as exigências de habilitação, ela será declarada vencedora do certame e, a partir desse momento, qualquer outra licitante poderá manifestar imediatamente, e com a devida motivação, a sua intenção de interpor recurso, quando lhe será concedido o prazo de três dias para a apresentação das razões. Ao término desse período, as demais licitantes poderão impugnar o recurso interposto no prazo de mais três dias, sendo que essas peças serão submetidas à análise de uma autoridade superior, para decisão a respeito.

No que tange ao prazo de três dias para recurso, e mais três dias para contra-razões, verifica-se que o texto legal dispôs somente “três dias”, sem fazer menção se esses dias são “úteis” ou “corridos”, o que leva a entender que se trataria de dias “corridos”. No entanto, o Decreto Federal n°. 3.555/00, em seu art. 11, inc. XVII, dispõe que esses três dias são “úteis”.

No prosseguimento, caso haja o provimento do recurso, serão invalidados apenas os atos insuscetíveis de aproveitamento, preservando o procedimento licitatório como um todo. Destaca-se, apenas, que somente depois de decididos os recursos é que a autoridade competente poderá efetuar a adjudicação à licitante vencedora, o que dá o efeito suspensivo a esses recursos, embora o art. 11, inc. XVIII do Decreto Federal nº. 3.555/00, que regulamenta o pregão na esfera federal, disponha que o recurso contra decisão do pregoeiro não terá efeito suspensivo. Ademais, prosseguir com a licitação antes de decididos os recursos poderia gerar prejuízos irreparáveis tanto para a licitação, quanto para os participantes, na hipótese de se verificar, após a contratação, algum procedimento que foi julgado irregular.

Na seqüência, se a licitante que ofertou o melhor lance não tiver sua proposta aceita, ou não cumprir as exigências de habilitação, o pregoeiro examinará a proposta subseqüente, verificando os mesmos itens, de forma sucessiva, até a verificação de uma licitante que tenha atendido aos ditames do edital, a qual será declarada vencedora do certame, com a conseqüente adjudicação.

No procedimento do pregão, não é só o pregoeiro que deverá possuir habilidades especiais, mas também os representantes das empresas licitantes, que deverão estar presentes nas sessões de abertura dos pregões, para poder exercer seu direito de dar lances, de negociar sua proposta, de saber o limite de suas ofertas e de poder expor seu interesse em interpor recurso, salientando que esses representantes deverão estar munidos de procuração para realizarem essas ações.

Homologada a licitação na modalidade de pregão, essa segue os mesmos procedimentos de uma licitação convencional, com a posterior assinatura do contrato.

Por fim, um outro aspecto inovador do pregão se refere às sanções que a licitante poderá sofrer, independentemente das penalidades já previstas no art. 87 da Lei n°. 8.666/93. O art. 7o. da Lei n°. 10.520 dispõe:

“Art. 7o. Quem, convocado dentro do prazo de validade de sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4o  desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.”

Entende-se que tal disposição sancionadora tenha sido inserida no texto legal como garantia da Administração, pois o procedimento do pregão, por ser mais simples, torna-o mais vulnerável, podendo representar um risco. Certamente, com penalidades mais severas, tem-se um maior comprometimento por parte dos participantes.

É importante lembrar que para a aplicação dessas sanções, e de quaisquer outras, o princípio da razoabilidade deverá estar sempre presente, verificando-se os reais transtornos causados pela ação faltosa, aliado ao princípio do contraditório e da ampla defesa, a fim de que não se cometam injustiças.

E, no próximo artigo, aguardem uma análise sobre o pregão eletrônico.

 

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