RHS Licitações

Política de compras na administração pública brasileira

 

Por: Paulo César Silva de Carvalho
 

1 – Evolução do Papel do Estado

O Estado do Bem-Estar Social, proposto nos séculos XIX e XX, influenciou de forma bastante significativa no papel do Estado em grande parte dos países capitalistas. Nesta doutrina, o Estado passou a diretamente prestar serviços sociais e intervir na economia.

O denominado “Novo Estado” nasce no Brasil nos anos 30 em meio a um cenário de aceleração da industrialização, assumindo um papel decisivo que lhe permite intervir diretamente no setor produtivo de bens e serviços.

No redimensionamento do papel do Estado, o modelo administrativo adotado foi o burocrático, que se caracterizou por uma forte padronização e controle dos procedimentos, o que se mostrou eficaz quando o Estado tinha pouca finalidade; entretanto, com o inchamento de suas funções, tornou-se lento e pesado, trazendo uma série de problemas relacionados a gestão.

As decisões ficaram bastante restritas e com controles burocráticos excessivos, privilegiando o controle de processos ao invés do controle de resultados.

A esse respeito, o ex-ministro Bresser (PEREIRA, 1998a) escreve:
Enquanto a administração pública burocrática se concentra no processo legalmente definido, em definir procedimentos para contratação de pessoal; para compra de bens e serviços; e em satisfazer as demandas dos cidadãos, a administração pública gerencial orienta-se para resultados. A burocracia concentra-se nos processos, sem considerar a alta ineficiência envolvida, porque acredita que este seja o modo mais seguro de evitar o nepotismo e a corrupção. Os controles são preventivos, vêm a priori. Entende, além disso, que punir os desvios é sempre difícil, se não impossível; prefere, pois, prevenir, estabelecendo estritos controles legais. A rigor, uma vez que sua ação não tem objetivos claros – definir indicadores de desempenho para as agências estatais é tarefa extremamente difícil – não tem outra alternativa senão controlar os procedimentos.

A crise capitalista mundial dos anos 80 decretou o fim do Estado do Bem-Estar Social, que tinha sido a solução da crise dos anos 30. Surge a consciência de que o Estado deve se tornar um Estado Mínimo. Este passa a ser visto como um meio e não um fim em si mesmo. Começa a se redefinir no Brasil o papel do Estado, que de um modelo burocrático tende a assumir o papel gerencial.

Surge o Estado Liberal, defendendo a administração pública gerencial, que tem como características a descentralização administrativa, a delegação de autoridade e de responsabilidade ao gestor público, rígido controle de desempenho, a otimização dos gastos públicos e a utilização de procedimentos mais flexíveis. (PEREIRA, 1998a).

Principalmente nos países ainda em desenvolvimento, o tamanho do Estado não sofreu grandes reduções, haja vista que este ainda vem servindo como redutor direto de passivos sociais existentes, ainda mantendo uma significativa carga de gastos. Assim sendo, resta a política de eficiência na utilização dos recursos públicos como saída para o equilíbrio econômico.

A crescente preocupação com o uso eficiente dos recursos públicos tem resultado em iniciativas voltadas para o controle das despesas com compras e contratações. Embora essas despesas representem uma parcela menor no orçamento relativamente às despesas com pessoal, o bom gerenciamento dos recursos aplicados em custeio constitui uma alternativa complementar para o aumento da eficiência na utilização dos gastos públicos e para melhorar o desempenho das organizações governamentais. (ENAP, 2002).

2 – Compras Públicas no Brasil

2.1 – Licitação

Devido ao reconhecimento da importância do uso eficiente dos recursos públicos, a Constituição Federal de 1988 trouxe no inciso XXI do art. 37 a previsão legal que obriga que as obras, serviços, compras e alienações públicas sejam feitas através de processo licitatório, assegurando igualdade de condições a todos os concorrentes.

XXI – Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigação de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

A previsão constitucional foi regulamentada pela Lei Federal nº 8.666, de 21 de junho de 1993, atualizada pelas Leis nº 8.883, de 8 de junho de 1994, 9.648, de 27 de maio de 1998 e pela Lei 9.854, de 27 de outubro de 1999. É a lei geral de Licitações e Contratos Administrativos.

Apesar de ter sido sancionada sobre o período de influência da política gerencial, 1993, a lei que normatiza os processos de compras da administração pública no Brasil, é caracterizada pela sua rigidez e elevado controle burocrático. Entretanto, tem-se que considerar que se vinha de um processo de impeachment do Presidente da Republica, exatamente por suspeitas de favorecimentos em contratações no governo federal, sendo que estes acontecimentos influenciaram para o engessamento da previsão legal que estava por vir.

A Lei 8.666/93 é considerada por alguns especialistas como um dos principais entraves à melhoria da gestão das aquisições governamentais. Estes afirmam que a licitação traz regulamentações extremamente complexas e morosas e que não garante a pretendida transparência e a ausência de corrupção.

O excesso de formalismo e de uniformidade nos procedimentos desta Lei leva a uma demora excessiva para a realização de qualquer processo de compra além de se apresentar como uma forma de controle burocrático de eficácia duvidosa (PIMENTA, 1998).

Barros (1995) explica que:

Com a licitação, entre outros fins, o legislador procurou garantir a contratação contra conluios, partindo do pressuposto ou do preconceito de que administradores e administrados não merecem confiança. Mas os conluios subsistiram com a licitação. Existem na licitação. Essa impotência do instituto levou a doutrina a repetir o cotejo entre o risco de conluio que não deixa de existir e a perda de eficiência que passa a existir com a licitação, a fim de reiterar o questionamento em face daquele pressuposto de desconfiança. Os balanços recentes são mais negativos que os precedentes, concluindo pela ineficácia da licitação perante os seus fins.

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