Normalmente os responsáveis pelas licitações nas prefeituras dizem que o edital deve conter características onde pelo menos três marcas diferentes possam atender e disputar a licitação. É isso mesmo?
A POLÊMICA DA MARCA NA LICITAÇÃO PÚBLICA
A determinação da marca referente ao objeto da licitação é vedada, salvo estritas exceções. Neste sentido, as decisões dos Tribunais de Contas têm anulado licitações que estipulam uma determinada marca, sem que outra equivalente ou superior possa substituí-la.
Segundo a Lei n° 8.666/93, é vedada a realização de licitação cujo objeto inclua bens e serviços sem similaridade ou de marcas, características e especificações exclusivas; também impõe que no edital deve constar a especificação completa do bem a ser adquirido sem indicação de marca; e veda a preferência de marca, mesmo em face de inexigibilidade de licitação.
A lógica sistemática destas normas amolda-se ao princípio da isonomia, o qual impede o favorecimento à determinada marca, conferindo assim igualdade de oportunidades no acesso ao mercado público. Além disso, submete o particular ao interesse público, por meio da preservação da competitividade nas licitações.
De outro lado, não é raro que a Administração, quase sempre submetida ao critério legal do menor preço, seja “obrigada” a adquirir produtos e serviços de qualidade inferior. Para contornar essas circunstâncias, também não são raros os editais que exigem características técnicas exclusivas de uma determinada marca. Porém, isso configura um dirigismo implícito, reprovado pelos Tribunais. Afinal, a Constituição Federal determina que as licitações públicas assegurem igualdade de condições a todos os concorrentes, admitindo somente as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações (CF, Art. 37, Art. XXI).
De fato, a elaboração de especificações técnicas adequadas para fins licitatórios pode envolver complexidades e até impugnações, recursos, anulações e sanções. Nessa narrativa, cabe considerar como solução ou referência recomendável o Catálogo de Materiais – CATMAT, do sistema COMPRASNET, administrado pela Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Este catálogo contém mais de 65.000 itens com seus respectivos padrões descritivos, que podem ser consultados no portal http://comprasnet.gov.br.
Contudo, há exceções que admitem a marca do produto no edital. Neste sentido, o Tribunal de Contas da União decidiu que “permite-se menção a marca de referência no edital, como forma ou parâmetro de qualidade para facilitar a descrição do objeto, caso em que se deve necessariamente acrescentar expressões do tipo ‘ou equivalente’, ‘ou similar’, ‘ou de melhor qualidade’, podendo a Administração exigir que a empresa participante do certame demonstre desempenho, qualidade e produtividade compatíveis com a marca de referência mencionada.” (Acordão 113/2016 – Plenário)
Importante notar que há outra hipótese de exceção admitida pelo Tribunal de Contas da União, sem obrigação de similaridade ou equivalência, preceituada na Súmula n° 270/2012: “Em licitações referentes a compras, inclusive de softwares, é possível a indicação de marca, desde que seja estritamente necessária para atender exigências de padronização e que haja prévia justificação.”
Ademais, cabe assinalar que a licitação torna-se inexigível diante de inviabilidade de competição, em especial para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo (Lei n° 8.666/93, Art. 25).
Portanto, a marca não deve ser citada no edital, exceto para fins de referência descritiva do objeto da licitação ou em face de padronização devida e robustamente justificada. Mesmo na hipótese de inexigibilidade de licitação, a contratação direta é admitida porque a competição não é viável, mas não em razão da escolha subjetiva de uma marca.
Por fim, recordemos que o edital pode vir a exigir que a proposta da empresa licitante indique a marca que oferece. Mas, ainda que o edital não a exija, é recomendável, senão necessário, que a proposta especifique a marca a que corresponde, sempre que houver.
(Colaborou Professor Dr. Roberto Baungartner – advogado, Mestre e Doutor especializado em Licitações Públicas e consultor jurídico da RHS LICITAÇÕES).