RHS Licitações

Licitação para semáforos emperra em SP com suspeitas e até carta de cônsul

16 de Agosto de 2017

A espera pela assinatura do contrato que seria o fim de uma licitação para a manutenção dos semáforos de São Paulo completa 41 dias nesta quinta-feira (17). Até agora, porém, nenhum sinal de a gestão do prefeito João Doria (PSDB) firmar o acordo com as vencedoras da disputa. O que se vê, além de um sistema caótico e quase abandonado que atrapalha o trânsito e provoca acidentes na cidade, é uma concorrência repleta de interrogações. A conduta de uma das responsáveis pelo pregão da CET está sob investigação, empresas derrotadas recorreram à Justiça e colocaram o processo sob suspeita; até um cônsul europeu entrou na jogada para questionar a “lisura da licitação”. No valor de R$ 40,5 milhões por um período de um ano (prorrogável para mais um ano), os contratos acabaram nas mãos das mesmas empresas que já prestaram o serviço e que, neste ano, atenderam pedidos do prefeito e fizeram doações à cidade. Para que a vitória delas seja confirmada, porém, resta ainda assinar o contrato. DISPUTA No início deste ano, a nova gestão da CET decidiu montar um edital para contratar empresas que fizessem a manutenção dos quase 6.400 semáforos da cidade. O último contrato havia acabado no fim de 2016. Enquanto aprontava a licitação, a CET pediu aos três consórcios que faziam a manutenção dos semáforos até o ano passado (liderados pelas empresas Meng, Serttle e Arc) que estendessem a garantia de seus serviços por três meses. Ou seja, as empresas se comprometeram entre os meses de janeiro e março a consertar novamente os semáforos defeituosos que já tivessem passado por suas equipes de manutenção, sem serem pagas pelo trabalho. Essa não foi a única concessão feita pelas empresas ao município neste período. Em janeiro, quatro empresas participantes dos antigos contratos de manutenção doaram à prefeitura de São Paulo e à CET a troca das placas e da sinalização que indicavam a velocidade máxima das pistas das marginais Pinheiros e Tietê. Outras duas empresas de sinalização semafórica também participaram da doação e não saíram vencedoras da licitação pelos semáforos. A escolha das empresas ocorreu após um chamamento público e o serviço saiu a R$ 703 mil pagos pelas empresas. O edital da CET só saiu em maio, mas foi logo questionado pelo Tribunal de Contas do Município. O órgão notou, entre outras falhas, a falta de detalhamento dos serviços que seriam prestados e como eles seriam pagos. Com o edital corrigido, em junho, a CET realizou um pregão eletrônico. A concorrência, porém, foi suspensa após a apresentação das propostas da maioria das empresas. A CET informou à imprensa que uma falha no sistema eletrônico do pregão inviabilizou o prosseguimento da concorrência. O registro das mensagens trocadas entre a pregoeira da CET e as empresas interessadas nos lotes, porém, mostra que a funcionária orientou equivocadamente que as empresas enviassem suas propostas de maneira diferente da solicitada no edital, o que provocou a suspensão do pregão. Uma investigação interna na CET apura o caso. DESCLASSIFICAÇÕES Quase um mês depois, em julho, um novo pregão foi feito pela CET e consagrou três vencedoras para os três lotes da cidade. No lote 1, a primeira colocada foi uma multinacional austríaca, Kapsch. Mas a companhia foi inabilitada por apresentar uma certidão do CREA (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia) com seu capital social desatualizado. A empresa recorreu à CET alegando que o registro do CREA tem como objetivo apenas comprovar sua capacidade técnica. Ouvidos pela Folha, os advogados Jorge Eluf Neto (presidente da comissão de controle social dos gastos públicos), Gustavo Henrique Schiefler e Igor Tamasauskas (especialistas em direito do Estado e licitações) concordam que, ao menos em tese, houve exagero por parte da CET. “Essa formalidade não é motivo de inabilitação, porque a comprovação de informações contábeis ocorre por meio de documentos próprios, como o balanço patrimonial e registros na Junta Comercial”, comenta Schiefler. A alegação da empresa, porém, não surtiu efeito. E por isso, o cônsul da Áustria em São Paulo solicitou um encontro com Doria, que até agora não ocorreu. Na última semana, a empresa acionou a Justiça. Mas sem entrar no mérito das discussões, a sentença decide que intervir neste momento no processo licitatório poderia causar prejuízo à manutenção dos semáforos, um serviço de interesse público. Outra empresa, a Pro Sinalização, foi inabilitada por não ter dado comprovações de que já havia instalado e mantido 50 unidades de no-breaks para semáforos, que é o dispositivo que permite o funcionamento do semáforo, mesmo quando falta energia (a empresa também havia participado da doação de placas nas marginais em janeiro). A Pro Sinalização alegou que já havia instalado 50 no-breaks em estações de ônibus de Curitiba. Para a empresa, laudos indicariam que o dispositivo das estações de Curitiba poderia ser instalado nos semáforos de São Paulo. A CET não aceitou as alegações. VENCEDORAS Com as eliminações, os contratos dos lotes foram oferecidos para as empresas Meng e Arc, no momento em que elas aceitaram reduzir suas propostas. As empresas, ao lado da Serttel, lideravam os três antigos consórcios que faziam a manutenção dos semáforos da cidade até 2016. Foram as três que aceitaram estender suas garantias até março e que também doaram placas às marginais. Após o pregão e antes da homologação do contrato, porém, Meng e Arc alteraram suas planilhas de custos. Ambas haviam apresentado, no momento do pregão, propostas que itens estouravam o valor estimado pela CET. As empresas então, arrumaram a defasagem num prazo de dois dias. A ARC alterou ao menos 63 itens da planilha de custos. A alteração das planilhas de custo após a apresentação da proposta no pregão é contestada pelas empresas eliminadas e condenada pela maioria dos especialistas ouvidos pela reportagem. Tamasauskas discorda e diz que, em casos de erros, é possível permitir a retificação da planilha antes de sua homologação. “No entanto, o órgão público não pode em um momento ser rigoroso ao ponto de recusar o registro do CREA com capital social desatualizado e em outro permitir uma planilha com valores corrigidos. É como um juiz de futebol que hora é rigoroso para um time e hora é brando para o outro. Isso traz desconfiança ao processo licitatório”, diz Tamasauskas. No fim de julho, antes mesmo que as empresas desclassificadas contestassem suas eliminações da concorrência, a CET anunciou à imprensa que faria uma força-tarefa com as novas detentoras dos contratos nos semáforos danificados da cidade. Em nota, a CET celebrou a postura das empresas vencedoras que “concordaram em antecipar o início do trabalho mesmo sem a garantia da assinatura dos contratos”. A CET e as empresas vencedoras dizem que cumpriram rigorosamente o que está previsto no edital da licitação e negam formalidade excessiva, apontada por parte das empresas ao longo do processo. Elas afirmam ainda que as doações foram feitas de maneira transparente. Até esta quarta-feira (16), a CET ainda aguardava que Meng e Serttel enviassem documentos necessários para fecharem os contratos. A Arc, segundo a CET, já teve o contrato fechado.

Fonte: Bem Paraná

 

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