Por: Roberto Baungartner
A busca do progresso tem aproximado os setores público e privado, cujos esforços vêm harmonizando seus interesses e superando a noção simplista de meros oponentes na dinâmica do mercado. É exemplo disso as parcerias público-privadas.
A publicização do privado e a privatização do público são fenômenos globais que repercutem nos regimes jurídicos das nações. As melhores práticas públicas e privadas efetivam os fundamentos constitucionais: cidadania, dignidade da pessoa humana e valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. O desenvolvimento, a justiça social e a distribuição de renda interessam ao Brasil, a despeito de eventuais descompasses entre o lucro privado (ou estatal) e o interesse público.
Esses propósitos e a desejada eficiência no atendimento do interesse público tornam necessária a valorização do servidor. Porém, seus vencimentos vêm caindo desde os anos 90. Segundo o IBGE, em abril de 2004 o rendimento dos empregados no setor público nas regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre foi de R$1.260,00. Os trabalhadores públicos no Nordeste ganham, na base, cerca de um salário mínimo. As gratificações de desempenho de atividade representam até 80% da remuneração do servidor que, na aposentadoria, perde até 60% do que recebia na ativa.
O quadro de servidores vem diminuindo em face das aposentadorias, demissões, afastamentos e falta de concursos. Por exemplo, a Advocacia Geral da União (AGU) tem menos de 1,3 mil advogados cuidando de mais de l ,2 milhão de processos.
Nesse cenário de mais trabalho e menos vencimentos, vê-se alguns esforços equivocados para contornar o problema, como a eventual substituição do voucher-refeição por pecúnia no contracheque do servidor, criando a impressão de mais ganhos.
Entretanto, o auxílio-alimentação em dinheiro na conta-salário do servidor paga CPMF, é absorvido pêlos juros do cheque especial, não entra nos cálculos da aposentadoria e sujeita-se ao arresto por dívida. Então, o servidor reduz o padrão alimentar, prejudicando a saúde e a produtividade. Mais restaurantes e similares vão à falência, cai a arrecadação de ICMS e aumenta o desemprego na cadeia produtiva que vai do plantio aos restaurantes e gôndolas dos supermercados.
Os empregados públicos celetistas são regidos pelo Regime Geral de Previdência Social – assim, sobre o auxílio-alimentação em dinheiro devem incidir os respectivos encargos. Do contrário, a administração pode ser inscrita no Cadin e no MPAS, não obtendo o Certificado de Regularidade Previdenciária nem a Certidão Negativa de Débito do INSS, ficando impedida de receber recursos e financiamentos da União.
Todos os meses 15%, em média, dos 5.569 municípios deixam de receber verbas sociais por não terem a certidão do INSS, num bloqueio que varia de R$ 15 milhões a 20 milhões, segundo a Secretaria Nacional de Assistência Social.
A soma do auxílio-alimentação ao salário do trabalhador pode elevar sua renda, atingindo uma faixa maior de IR, que não pode ser isentada por estados e municípios porque não têm competência constitucional para tanto.
Em muitos países há sistemas de vouchers e cartões exclusivos para a alimentação dos trabalhadores públicos e privados. Na França e na Itália, há leis próprias que concedem vouchers-refeição aos funcionários públicos.
O Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) é a melhor referência no Brasil, por ser do Estado, perdurando por sete mandatos presidenciais desde sua criação em 1976, beneficiando trabalhadores públicos e privados na forma de cartões e vouchers-refeição/alimentação, restaurantes industriais, cestas e refeições prontas.
Quando o vouchers-refeição vai para a conta-salário, paga tarifas bancárias e dívidas, em lugar de refeições e alimentos. Pelas mesmas razões, há meios não-monetários que asseguram certos direitos inalienáveis, como a saúde (seguros) e o transporte coletivo (vale-transporte).
Roberto Baungartner é advogado, mestre e doutorando em direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).