A primeira minirreforma da Nova Lei de Licitações: uma análise técnica — Nasce o fruto da MPV nº 1.167/23
Um título menos chamativo, desprovido de figuras de linguagem ou de jogos de palavras, faz o pórtico deste artigo. Tal não é um acaso, certamente. A opção vem, inexoravelmente, com um trade-off: arrefece-se o potencial de atração ao texto, de um lado; cinge-se a dimensão técnica como norte a guiar as discussões, de outro. Eis o recorte preciso destas páginas, que visam a alçar contornos pragmáticos e resolutos, sem adentrar em subjetivismos que em nada favoreceriam nossa navegação em águas já turbulentas.
Nos primeiros minutos do dia 30 de novembro, a Câmara dos Deputados, enquanto Casa Revisora, aprovou, em sessão semipresencial, o Projeto de Lei nº 3.954/23!, que dá vida ao ímpeto de uma primeira minirreforma no bojo da Nova Lei de Licitações e Contratos (Lei nº 14.133/21). O PL, de autoria da Senadora Tereza Cristina, é oriundo da proposta originalmente apresentada para fins da conversão da Medida Provisória nº 1.167, de 2023?, cuja perda de eficácia deu-se no dia 28 de julho do corrente ano, sem apreciação derradeira pelo Congresso Nacional.
Eis uma lição do que é o processo legislativo pátrio: em ótica superficial, a citada Medida Provisória naufragou, tendo caducado. Em visão outra, o projeto de conversão criou vida em outro projeto, com tramitação muito ágil em nossas Casas Legislativas: entre a autuação e a provação do PL no Parlamento, contam-se (apenas) 106 dias corridos.
Malgrado a intensidade do impacto advindo do projeto, mister assinalar que sua apreciação em plenário se deu de forma assaz expedita. Em cerca de 60 minutos, votou-se o requerimento de urgência e o mérito da matéria, consubstanciando episódio que contou com protestos pontuais de parlamentares presentes?. Em adição, o relatório de análise do PL, na Câmara dos Deputados, em contradita à sua complexidade e multidimensionalidade, é hiper sintético: apenas 4 páginas de voto, sem análise de pontos como a adoção do
modo fechado para licitação de obras. De toda sorte, sua aprovação foi expressiva: em um quórum de 336 deputados, 307 favoráveis ao PL, 27 contrários e 1 abstenção. Fato é que o PL nº 3.954/23, ora apensado ao PL nº 2228/22, segue à sanção presencial.
De relevo, ressalta-se, já nos momentos finais da discussão em plenário, a fala do Deputado Alencar Santana (PT-SP), no sentido de ter havido diálogo prévio sobre o projeto com o governo, que, em seu turno, haveria manifestado resistência quanto a alguns de seus pontos. Como arrumação final, teria sido ficado acordada a votação favorável da matéria, tendo em vista que qualquer alteração, nesse momento, faria com que o projeto retornasse ao Senado Federal. O encaminhamento informal seria pela sanção das alterações
nos artigos 90 e 105 da Lei nº 14.133/21 (alternativas de aproveitamento de recursos orçamentários em contratos administrativos), sendo que eventuais vetos de dispositivos, pelo Poder Executivo federal, não seriam derrubados pelo Parlamento. A ver.
O PL nº 3.954/23 traz impactos em seis dimensões principais, a saber: (i) obras e serviços de engenharia; (ii) aumento das opções logísticas a municípios; (ili) aproveitamento de recursos orçamentários, (iv) pagamento de contratos, (v) garantia contratual e (vi) transferências de recursos. Trata-se de variáveis de primeira grandeza no cenário logístico pátrio, o que justifica a alcunha de minirreforma licitatória, que intitula esse singelo texto.
O Quadro a seguir dedica-se à perspectiva analítica das mudanças propostas. Contempla, mais a mais, e à luz da argumentação tecida, sugestão de encaminhamento quando da sanção do projeto.
Considerações finais
Já emergindo da incursão analítica, outro prisma faz morada no desfecho deste texto.
O PL nº 3.964/23, mais do que em perspectiva estática, merece uma visão temporal e dinâmica. Consubstancia uma senso de acomodação da Nova Lei de Licitações pela sociedade, mediante suas instituições.
Em paralelo à jurisprudência sendo edificada em seus primeiros pilares, a minirreforma proposta é um rearranjo das neófitas estruturas legais à prática sociológica. E que assim seja.
Há, no PL em comento, avanços e retrocessos. Aperfeiçoamentos e riscos. Dicotomias próprias à atuação institucional.
De relevo, tem-se que não será a última mudança legal. Será, sim, a primeira mais robusta, de inúmeras que virão. O importante é, em paralelo, estruturarmos arenas adequadas de debate, para fins de melhor qualificação das mudanças.
Vamos em frente.
1 O PL nº 3.954/23 foi apensado ao PL nº 2.228/22.
2 É o destacado formalmente pela parlamentar no prelúdio da justifiação constante em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9407245&ts=1695856351617&rendition=stored-leg-signed-pdf&disposition=zinline. Acesso em 02.12.23.
3 Sessão disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=v21 sNqgC5e4. Acesso em 02.12.23. Apreciação do PL nº 3.954/23 a partir de 9h15”.