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Nova lei de contratos públicos pode favorecer acesso a terapias inovadoras – Saulo Stefanone Alle – Professor RHS

Tratamentos inovadores envolvem medicamentos de alto custo, no Brasil e no mundo. E, nesse assunto, desenvolvimento de pesquisas, coleta de dados, investimentos e seus riscos associados, andam absolutamente juntos. Não há um sem o outro. Não há pesquisa sem investimentos de risco. Nem há desenvolvimento sem coleta de dados em condições reais e não existe qualquer dessas etapas sem que o custo seja transferido para o preço do tratamento. E, de algum modo, é preciso organizar riscos e custos, contratualmente, para tornar o sistema mais eficiente e viável.

Segundo a OECD, espera-se que os medicamentos de alto custo sejam os grandes responsáveis pelo aumento de gastos com saúde, tanto em razão do aumento na demanda, quanto em razão das terapias inovadoras. Dados oficiais, da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Anuário da SCMED – 2019) confirmam que os gastos com medicamentos novos tiveram maior representatividade no mercado, somando mais de R$ 30,5 bilhões.

Reperodução

Os grandes impactados pelas cifras são os planos de saúde e o SUS (Sistema Único de Saúde), que precisam garantir a eficiência de seus apertados orçamentos. Dispêndios com tratamentos sem avaliação adequada de custo-benefício e de eficiência significam um risco elevado de ineficiência. Por outro lado, sem inovação não se abrem caminhos de maior eficiência. Para tentar organizar interesses, necessidades, custos e riscos, o mercado farmacêutico desenvolveu a ideia do Risk Sharing Agreement (RSA) ou, em português, Acordo de Compartilhamento de Riscos.

No Brasil, a liberdade contratual própria do mercado privado facilita a acomodação de arranjos jurídicos inovadores, no contexto dos planos de saúde. Já no âmbito do SUS, em que os contratos estão sujeitos a um regime legal bastante específico, a importação da ideia do Acordo de Compartilhamento de Riscos (RSA) causou algum estranhamento inicial. Entretanto, vale dar menos peso à nomenclatura, e voltar a atenção aos conceitos — e, esses elementos conceituais que forma o modelo do RSA estão, agora, refletidos em institutos presentes na nova Lei de Licitações e Contratos Públicos, a Lei nº 14.133/2021.

Na verdade, mesmo sob o título de Acordo de Compartilhamento de Risco, a relação é essencialmente de compra e venda de medicamentos. O que há de diferenciado nessa relação contratual, a rigor, é o conjunto de condições de garantia e a matriz de risco. Dentro dessas duas categorias, de matriz de risco e de garantia, a indústria assume a responsabilidade pela insuficiência de volume, pelos custos extraordinários e imprevisíveis advindos de incertezas clínicas, entre outras incertezas. Para implementar essas características, é necessário definir preços diferenciados para uma mesma contratação (ou compromisso de contratação), realizar uma contratação sem definição prévia de volume máximo, por exemplo. Entretanto, essas “incertezas” eram incompatíveis com a lei de contratos públicos anterior (a Lei nº 8.666/93), mas estão expressamente permitidas pela nova lei de licitações e contratos.

Esses novos institutos legais, além de outros, permitirão a construção de arranjos jurídicos mais complexos, para aprimorar a eficiência na aquisição de tratamentos inovadores e de alto custo pelo SUS. É preciso destacar, contudo, que as ferramentas estão disponíveis na lei de maneira desconectada, que são novidades, e que, por isso, precisam ser exploradas de maneira ativa, com o objetivo concreto de conceber os arranjos mais ajustados a essa demanda tão particular.

A absorção rápida de terapias inovadoras representa atenção ao bem-estar individual e benefícios para a saúde coletiva. Viabiliza mais investimentos em inovação, absorção mais rápida de custos e disseminação de alternativas mais eficientes para a saúde. O papel do SUS é central, nesse sistema, e a montagem de arranjos jurídicos, aproveitando o potencial que a nova lei de contratos públicos oferece, certamente facilitará a composição de interesses, riscos e custos, para promover um crescente acesso e disseminação de novas terapias.

https://www.conjur.com.br/2023-mai-07/saulo-alle-lei-contratos-publicos-terapias-inovadoras

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