A partir desta quarta-feira (29), é hora de acompanhar se o estipulado no papel será aplicado na prática
Sabe aquela empresa que, após fraudar uma licitação, voltou à ativa com outro CNPJ? Ou aquela de fachada usada por seus sócios para ganhar vantagens em contratos públicos? Elas são comuns no Brasil. Companhias aparecem em escândalos de corrupção e continuam a fazer negócios – e ganhar vantagens – em contratos públicos. Para inibi-las, foi sancionada em agosto do ano passado a Lei Anticorrupção Empresarial (nº 12.846 ), que entra em vigor nesta quarta-feira (29). A nova legislação pune pessoas jurídicas envolvidas em casos de corrupção com a administração pública. A lei prevê que empresas, fundações e associações de pequeno, médio e grande porte passem a responder judicial e administrativamente por ações ilícitas de seus funcionários ou representantes que, de alguma forma, causem prejuízos ao patrimônio público – por meio da corrupção de agentes públicos, de fraudes de licitações e contratos, entre outros. Antes, os funcionários envolvidos nesses tipos de crimes respondiam individualmente, como pessoa física, por corrupção passiva ou ativa. Agora, a responsabilidade recairá também sobre as empresas que esses funcionários representam.
Pelas novas regras, as empresas condenadas serão punidas com multas de 0,1% a 20% do faturamento bruto – ou até R$ 60 milhões, quando o cálculo não for possível. O valor da multa nunca será inferior ao da vantagem obtida por meio da corrupção. Além da multa, a empresa deverá reparar integralmente o prejuízo causado aos cofres públicos e seu nome passará a constar no Cadastro Nacional de Empresas Punidas (Cnep). Dependendo da gravidade do caso, a empresa será obrigada a divulgar a condenação em seu próprio site e até em grandes veículos de comunicação. “A empresa condenada será punida não só financeiramente, mas também terá sua reputação prejudicada”, diz o advogado especialista em direito empresarial Giovanni Falcetta, do escritório de advocacia Aidar SBZ.
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Bens e direitos relacionados ao ato ilícito podem ser confiscados e as atividades da empresa, suspensas. Em casos mais graves, ficará, por até cinco anos, proibida de receber doações, subsídios, incentivos fiscais ou fazer empréstimos de instituições públicas. A lei prevê também que a Justiça determine o fim das atividades da empresa, a chamada dissolução compulsória. As penas administrativas serão aplicadas pela Controladoria-Geral da União (CGU) ou pelo ministério da pasta envolvida no caso de corrupção.
Além de penas severas, a nova lei facilitará as condenações, já que não será mais preciso comprovar que houve a intenção do ato ilícito por parte da empresa. A comprovação de corrupção já será suficiente. Se a empresa for vendida ou se fundir a outra, a multa passará aos novos proprietários.
“A nova lei mudará o jeito como se faz negócio no Brasil, porque as empresas se preocuparão com as consequências financeiras e em sua reputação causadas por atos de corrupção”, diz Falcetta. Para o especialista em direito empresarial, as companhias devem se empenhar em prevenir, detectar e remediar a corrupção por parte de seus funcionários. “O código de ética e conduta da empresa deve sair do mural e ser, de verdade, incorporado pelos funcionários.” O advogado sugere, por exemplo, que as companhias invistam na criação de mecanismos de incentivo a denúncias internas de irregularidades, de auditorias regulares para detectar possíveis desvios e de treinamentos de funcionários. “Se a empresa comprovar que mantém mecanismos para prevenir a corrupção, ela será beneficiada pela lei”, diz Falcetta. A nova legislação prevê que, empresas que tiverem histórico de programas de prevenção à corrupção, que cooperarem com a investigação federal ou que se autodenunciarem receberão penas mais brandas, a serem definidas caso a caso.
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O advogado também sugere às empresas incluir cláusulas em seus contratos trabalhistas que contemplem questões relacionadas a garantias e indenizações no caso da terceirização de serviços. “No exterior, cerca de 64% dos atos ilícitos são feitos por funcionários terceirizados”, afirma Falcetta. “É importante que as empresas brasileiras se protejam.”
Como boa parte dos empresários e investidores, o professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP) Wesley Mendes vê a Lei Anticorrupção Empresarial com ceticismo. Para ele, o histórico fraco da eficácia das leis brasileiras põe em dúvida se as regras sairão do papel. “Na teoria, a lei é bem elaborada. Na prática, é difícil acreditar que ela será eficaz e rápida no combate à corrupção empresarial”, diz.
(Fonte: Época)