Institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Capítulo I
DO ÂMBITO DE APLICAÇÃO DOS CONTRATOS DE PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA
Art. 1º Esta Lei institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada, no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Parágrafo único. Esta Lei se aplica aos órgãos da administração direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Capítulo II
DO CONTRATO DE PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA
Seção I
Conceito e Princípios
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se contrato de parceria público-privada o ajuste celebrado entre a administração pública e entidades privadas, que estabeleça vínculo jurídico para implantação ou gestão, no todo ou em parte, de serviços, empreendimentos e atividades de interesse público, em que haja aporte de recursos pelo parceiro privado, que responderá pelo respectivo financiamento e pela execução do objeto, observadas as seguintes diretrizes:
I – eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade;
II – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional e do exercício de poder de polícia;
III – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias;
IV – transparência dos procedimentos e das decisões;
V – repartição dos riscos de acordo com a capacidade dos parceiros em gerenciá-los;
VI – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas do projeto de parceria.
§ 1º É assegurada a qualquer interessado a apresentação à administração pública de proposta de contrato de parceria público-privada nos termos da legislação vigente, sem prejuízo da sua participação no respectivo processo licitatório.
§ 2º Os estudos, as investigações, os levantamentos, os projetos, as obras, as despesas e os investimentos realizados pela administração pública ou por ela autorizados, por força da aprovação de proposta encaminhada nos termos do § 1º deste artigo, serão colocados à disposição dos licitantes que disputarem a celebração do respectivo contrato de parceria público-privada, cumprindo ao beneficiário da adjudicação do objeto ressarcir os dispêndios correspondentes em valor a ser fixado no edital.
§ 3º A proposta prevista no § 1º deste artigo será publicada no veículo a que se refere o inciso XIII do art. 6º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, devendo a autorização mencionada no § 2º deste artigo ser precedida de procedimento licitatório específico quando surgir, no prazo de 15 (quinze) dias, a contar da publicação, manifestação de interesse por parte de pessoa física ou jurídica distinta do destinatário do ressarcimento previsto no § 2º deste artigo.
Seção II
Do Objeto
Art. 3º Pode ser objeto de parceria público-privada:
I – a delegação, total ou parcial, da prestação ou exploração de serviço público, precedida ou não da execução de obra pública;
II – o desempenho de atividade de competência da administração pública, precedido ou não da execução de obra pública;
III – a execução de obra para a administração pública;
IV – a execução de obra para sua alienação, locação ou arrendamento à administração pública.
Parágrafo único. As modalidades contratuais previstas nesta Lei, bem como as demais modalidades de contratos previstas na legislação em vigor, poderão ser utilizadas individual, conjunta ou concomitantemente em um mesmo projeto de parceria público-privada, podendo submeter-se a um ou mais processos de licitação.
Seção III
Das Regras Específicas
Art. 4º São cláusulas necessárias dos contratos de parceria público-privada:
I – prazo de vigência compatível com a amortização dos investimentos realizados, limitado a 35 (trinta e cinco) anos;
II – as penalidades aplicáveis à administração pública e ao parceiro privado para a hipótese de inadimplemento das obrigações contratuais, que deverão, quando se revestirem de caráter financeiro, ser fixadas eqüitativamente;
III – as hipóteses de extinção antes do advento do prazo contratual e os critérios para o cálculo, prazo e demais condições de pagamento das indenizações devidas;
IV – o compartilhamento com a administração pública, nos termos previstos no contrato, dos ganhos econômicos decorrentes da alteração das condições de financiamento;
V – a identificação dos gestores responsáveis pela execução do contrato, no que tange ao parceiro privado, e pela fiscalização da conformidade com os termos do ajuste, relativamente ao ente público signatário do contrato;
VI – a forma e a periodicidade de atualização dos valores envolvidos no contrato.
§ 1º As indenizações de que trata o inciso III do caput deste artigo poderão ser pagas à entidade financiadora do projeto de parceria.
§ 2º Nas hipóteses de execução de obra, ao término do contrato de parceria público-privada, a propriedade do bem móvel ou imóvel, salvo disposição contratual em contrário, caberá à administração pública, independentemente de indenização.
Seção IV
Da Remuneração
Art. 5º A contraprestação da administração pública nos contratos de parceria público-privada poderá ser feita por:
I – ordem bancária;
II – cessão de créditos não-tributários;
III – outorga de direitos em face da administração pública;
IV – outorga de direitos sobre bens públicos;
V – outros meios admitidos em lei.
§ 1º Os contratos previstos nesta Lei poderão prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho na execução do contrato, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade previamente definidos.
§ 2º Nas concessões e permissões de serviço público, a administração pública poderá oferecer ao parceiro privado contraprestação adicional à tarifa cobrada do usuário, ou, em casos justificados, arcar integralmente com sua remuneração.
§ 3º A contraprestação da administração pública será obrigatoriamente precedida da disponibilidade ou do recebimento do objeto do contrato de parceria público-privada.
§ 4º A contraprestação de que trata o § 3º deste artigo poderá ser vinculada à disponibilização ou ao recebimento parcial do objeto do contrato de parceria público-privada nos casos em que a parcela a que se refira puder ser usufruída isoladamente pelo usuário do serviço público ou pela administração contratante.
Seção V
Das Garantias
Art. 6º As obrigações contraídas pela administração pública com o parceiro privado relativas ao objeto do contrato de parceria público-privada serão garantidas na forma desta seção, sem prejuízo de outros mecanismos admitidos pela legislação.
Art. 7º Para o cumprimento das obrigações mencionadas no art. 6º desta Lei, será admitida a vinculação de receitas e a instituição ou utilização de fundos especiais, desde que previstos em lei específica.
Art. 8º Para concessão de garantia ao cumprimento das obrigações a que se refere o art. 6º desta Lei, fica a União autorizada a integralizar recursos, nos termos da legislação pertinente e na forma que dispuser ato do Poder Executivo, em fundos fiduciários de incentivo às parcerias público-privadas criados por instituições financeiras públicas.
§ 1º A integralização a que se refere o caput deste artigo poderá ser realizada com os seguintes recursos públicos:
I – dotações consignadas no orçamento e créditos adicionais;
II – transferência de ativos não-financeiros;
III – transferência de bens móveis e imóveis, que poderão ser alienados na forma da legislação pertinente;
IV – recursos provenientes de outras fontes.
§ 2º A integralização de recurso em fundo fiduciário mediante a transferência de ações de companhias estatais ou controladas pela administração pública, nos termos do inciso II do § 1º deste artigo, não poderá acarretar a perda do controle acionário pela União.
§ 3º Os saldos remanescentes dos fundos fiduciários, ao término dos contratos de parceria público-privada, serão reutilizados em outros projetos, na forma deste artigo, ou, sucessivamente, revertidos ao patrimônio do ente que integralizou os respectivos recursos.
§ 4º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão, mediante lei específica, autorizar a integralização de fundos fiduciários com as características referidas neste artigo.
Art. 9º O contrato de parceria público-privada poderá admitir, em favor da entidade financiadora do projeto de parceria:
I – emissão dos empenhos relativos às obrigações de que trata o art. 6º desta Lei diretamente em seu nome;
II – legitimidade para receber pagamentos efetuados por intermédio dos fundos previstos no art. 8º desta Lei.
Capítulo III
DA LICITAÇÃO
Art. 10. A contratação de parceria público-privada deve ser precedida de licitação na modalidade de concorrência, observado o seguinte:
I – o edital indicará expressamente a submissão da licitação e do contrato às normas desta Lei;
II – a concorrência será promovida com a exigência de pré-qualificação;
III – o edital de licitação poderá exigir:
a) garantias de proposta e de execução do contrato, suficientes e compatíveis com os ônus e os riscos decorrentes da hipótese de não ser mantida a proposta ou de não serem cumpridas as obrigações contratuais, não se aplicando as limitações previstas na legislação em vigor;
b) como condição para celebração do contrato, que o licitante vencedor adote contabilidade e demonstração financeira padronizadas;
c) a adoção da arbitragem, em relação a aspectos previamente delimitados, para solução dos conflitos decorrentes da execução do contrato.
§ 1º As propostas incluirão a taxa percentual projetada de retorno financeiro sobre o capital investido.
§ 2º O edital estabelecerá, como condição para celebração do contrato, que o licitante vencedor constitua sociedade de propósito específico para implantar ou gerir o respectivo objeto, sendo que os bens resultantes do investimento ficarão como propriedade da sociedade.
§ 3º O projeto de parceria público-privada será objeto de audiência pública, com antecedência mínima de 30 (trinta) dias da publicação do edital da respectiva licitação, mediante a publicação de aviso na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, na qual serão informadas a justificativa para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato e seu valor estimado, fixando-se prazo para oferecimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos com 7 (sete) dias de antecedência da data prevista para a publicação do edital.
Art. 11. A abertura de processo licitatório para contratar parceria público-privada está condicionada a despacho fundamentado da autoridade competente, a partir de estudo técnico que demonstre sua conveniência e oportunidade, e ao cumprimento das seguintes regras:
I – elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada;
II – previsão de fluxo de recursos públicos suficiente para o cumprimento, a cada exercício, das obrigações contraídas pela administração pública no decorrer do contrato;
III – declaração do ordenador da despesa de que as obrigações contraídas pela administração pública no decorrer do contrato são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias, e estão previstas na lei orçamentária anual;
IV – inclusão de seu objeto no plano plurianual em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado;
V – sempre que o objeto do contrato da parceria público-privada – PPP exigir licença ambiental prévia ou autorização equivalente na forma de regulamento.
§ 1º Para efeito do atendimento do que prevê o caput deste artigo, o ato será acompanhado de comprovação de que as despesas criadas ou aumentadas não afetarão as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.
§ 2º A comprovação referida no § 1º deste artigo conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade das despesas com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.
§ 3º A assinatura do contrato de parceria público-privada fica condicionada à observância das medidas referidas no § 1º deste artigo.
Art. 12. A licitação, após a fase de pré-qualificação e desde que previsto no edital, observará os seguintes procedimentos:
I – a administração pública receberá propostas técnicas dos licitantes e procederá à avaliação e classificação destas propostas de acordo com critérios pertinentes e adequados ao objeto licitado, definidos no edital;
II – classificadas as propostas técnicas, a administração pública poderá determinar adequações, limitadas ao respectivo conteúdo, que reputar conveniente para atendimento do interesse público, mantendo-se as pontuações inicialmente atribuídas;
III – será fixado no edital prazo suficiente e razoável para atendimento das determinações da administração;
IV – encerrada a fase de adequação das propostas técnicas, a administração pública receberá as propostas econômicas dos licitantes;
V – os licitantes poderão apresentar, em dia, hora e local previamente definidos, em sessão pública, novas e sucessivas propostas econômicas até a proclamação do vencedor, nas condições e prazos previstos no edital;
VI – o edital poderá limitar o direito de apresentação de novas e sucessivas propostas econômicas aos licitantes que se situarem em intervalo definido no edital a partir da proposta inicialmente classificada em primeiro lugar;
VII – não existindo pelo menos 3 (três) propostas econômicas situadas no intervalo previsto no edital, os autores das 3 (três) melhores propostas poderão oferecer novas e sucessivas propostas econômicas;
VIII – o oferecimento de novas propostas econômicas será efetuado na ordem inversa da classificação resultante da apresentação da primeira proposta econômica.
Art. 13. A licitação será julgada de acordo com um dos seguintes critérios, na forma definida pelo edital:
I – melhor proposta econômica;
II – melhor combinação entre a proposta técnica e a econômica, observado o disposto no caput e no § 3º do art. 46 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
Parágrafo único. Além de outros aspectos relacionados à natureza do objeto do contrato de parceria público-privada, a proposta econômica poderá abranger:
I – o valor das tarifas a serem cobradas dos usuários após a execução da obra ou do serviço;
II – os pagamentos devidos pelo parceiro privado em razão da concessão ou da permissão do serviço abrangido pelo contrato;
III – a contraprestação da administração pública, a ser efetuada nos termos do art. 5º desta Lei;
IV – as melhorias ou benfeitorias a serem realizadas no patrimônio público envolvido na execução do objeto;
V – as utilidades e benefícios a serem assegurados às populações alcançadas pelo contrato de parceria público-privada.
Capítulo IV
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 14. Ato do Poder Executivo instituirá órgão gestor colegiado com a finalidade de, no âmbito da administração pública federal, fixar procedimentos para contratação de parcerias público-privadas, definir as atividades, obras ou serviços considerados prioritários para ser executados sob o regime de parceria, bem como autorizar a abertura de processo licitatório para contratar parceria público-privada.
§ 1º O corpo permanente do órgão mencionado no caput deste artigo será composto por indicação nominal de um representante titular e respectivo suplente de cada um dos seguintes órgãos:
I – Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ao qual cumprirá a tarefa de coordenação das respectivas atividades;
II – Ministério da Fazenda;
III – Casa Civil da Presidência da República.
§ 2º Das reuniões do órgão a que se refere o caput deste artigo para examinar projetos de parceria público-privada participará um representante do órgão da administração direta cuja área de competência seja pertinente ao objeto do contrato em análise.
§ 3º Para o desempenho de suas funções, o órgão citado no caput deste artigo poderá criar estrutura de apoio técnico com a presença de representantes de instituições públicas e privadas.
§ 4º Compete aos Ministérios e às agências reguladoras, nas suas respectivas áreas de competência, o acompanhamento e a fiscalização dos contratos de parceria público-privada, bem como o exame da conformidade do contrato e de sua execução com as normas que regem o setor a que pertença o respectivo objeto.
§ 5º Os Ministérios encaminharão ao órgão a que se refere o caput deste artigo, com periodicidade trimestral, relatórios circunstanciados acerca da execução dos contratos de parceria público-privada, na forma a ser regulamentada em ato do Poder Executivo.
§ 6º O órgão de que trata o caput deste artigo remeterá ao Congresso Nacional, com periodicidade semestral, relatórios de desempenho dos contratos de parceria público-privada.
Art. 15. O Conselho Monetário Nacional estabelecerá, na forma da legislação pertinente, as diretrizes para concessão de crédito para financiamento de contratos de parcerias público-privadas.
Capítulo V
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 16. Aplica-se às parcerias público-privadas o disposto na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e, no caso de concessões e permissões de serviços públicos, o disposto na Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e na Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, no que não contrariar esta Lei.
Art. 17. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
CÂMARA DOS DEPUTADOS, de março de 2004.